segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Dia de Lagarta, Borboleta e Vento.


Desenho de Marlua de Sousa Correia


Era mais um dia de Lagarta. Lagarta falsa, Lagarta que há muito havia saído do casulo e se tornara Borboleta. Mas amarrava-se, amarrava suas asas com medo de alçar seu primeiro voo, e o Vento paciente em brisa insistindo nessa Lagarta que ele sabia ser Borboleta.
E a Lagarta Borboleta chorava com seus olhos de gude, olhos típicos de sua infância, que trazia ao Vento lembranças boas, mas ao insistir em ser Lagarta machucava o Vento, e se machucava, e se amarrava. E o Vento nas manhãs frias ou quentes se transformava em Orvalho para estar mais próximo à Lagarta Borboleta. 
Um dia quando o Vento em brisa se torna tufão, a Lagarta Borboleta decide tirar as amarras, e se mostrar... asas azul celeste, roxa, incandescente, mesmo que ainda machucada pelas amarras... e se mostra Borboleta, inteiramente Borboleta. O Vento rodopia, não acredita, sente a vontade de ajudar no voo dessa Borboleta, mas está tudo muito confuso, o Vento vem em brisa, em tufão..mais uma vez em brisa... e de novo em tufão.. e a Borboleta alçando o voo, ainda com as asas machucadas, pois as amarras foram tiradas há poucos instantes.
Ela diz ao Vento que tudo o que houve, que os erros e o voo tardio era o medo, o medo de sair daquela folha de conforto, onde era apenas Lagarta, e não percebia que Lagarta machuca, consome, destrói. Mas agora, mesmo que tarde ela voa, e mostra que nasceu para ser Borboleta.
Nesse dia o céu chorava, a Lagarta desaparecia, a Borboleta surgia e o Vento não ventava, e ventava, e soprava tão calmo, mas em tantas direções que a Borboleta ainda se acostumando a mostrar-se Borboleta seguia em direção ao Vento. A Borboleta só quer que o Vento ainda vente em seus voos, seja em brisa ou em tufão. A Borboleta deseja com todas as forças em suas asas que o Vento se torne todas as manhãs Orvalho para refrescar as asas ainda doídas, mas belas... e ajude num sopro, o sopro de vida, liberdade e quiçá amor dessa Borboleta; pois Borboleta nasceu para sugar o néctar sem machucar, e o sabe fazer, pois a Borboleta deixou de tentar permanecer Lagarta que machuca, consome e destrói. Ela é Borboleta que embelezará o Vento, que tornará os dias do Vento brisa,  quando necessário Orvalho apenas pelo Vento saber que eles existem juntos, e alçam voo juntos, e se completam.
Vento!!! Ela tem certeza!!! Ela será para sempre Borboleta!!

terça-feira, 22 de novembro de 2011

História, Vida e Papéis de uma Cigarra.

Desenho de Marlua de Sousa Correia


Será que é assim mesmo que se sente a cigarra?
Será que ela se sente tão cheia a ponto de explodir de tanto cantar, de tanto ser música, de tanto ser nota, de tanto ser instrumento?
Eu me sinto assim,Cigarra, mas cigarra que não sabe se canta ou se explode, ou se explode de tanto que canta, ou se canta para que se exploda!!
Paro ao ouvir algo da moda, Gadú, Céu, Cañas, e gosto. Mas queria ouvir um Jazz, um Blues, na companhia de alguém quente em dia de frio. Numa rede de fibra, numa esteira de palha. Num lugar onde só existisse a vitrola, os corpos, a esteira (ou a rede), uma manta e o desejo, a satisfação, o prazer. Numa casa que ainda não tenho, o alguém que quero ter por muito tempo, no frio que tardará a chegar, no tempo que não é compatível com  meu, o meu é "AGORA!" o que me impõem é o "AMANHÃ QUEM SABE!", quero viver de coisas incertas, mas que me deem segurança; quero os braços que me acalantam, mas que me fazem solfejar de lasciva. 
Não paro de querer. Não pararei de querer, o tudo que eu não tive, o tudo que eu tive e quero repetir, aquilo que não pensava em ter, mas me foi proporcionado. 
Quero tudo e não perder nada, só não queria estar aqui agora presa em uma sala escrevendo por um teclado. Odeio papéis, mas os amo quando ouço o barulho do lápis. Sim!! Do lápis, gosto do lápis, não da caneta; a caneta nos impede de ser despreocupados, de escrever o que sentimos, com a caneta escrevemos sempre o que achamos ser certo, pois temos a ideia de jamais poder apagar o que se escreve à caneta. O lápis nos deixa livres, errou, apague, faça novamente, mas nem é preciso porque as palavras brotam com tamanha facilidade, tamanha pureza e tamanha delícia que tudo que sai é verdadeiro e não deve ser mudado, porque sabemos que podemos ser nós mesmos, que podemos errar que tudo é apagado e reescrito. Odeio papéis, mas os amo quando já estão escritos, repletos de tudo que eu nem sabia que sentia, que eu nem sabia que sabia. Odeio papéis, mas os amo quando espirro ao abrir um livro velho, e ver as páginas amareladas que nem parecem papel.Odeio os papéis novos, brancos, intactos; amo-os quando velhos, amarelados, cheirando ao que já se sentiu, ao que já se escreveu, cheirando a história que não se sabe. Odeio os papéis, quando vejo que minha vida será escrita em papéis brancos, novos, que só os amarei quando talvez eu nem aqui estiver, e outros que odeiam papéis novos, brancos, que não nos fazem espirrar, poder ler o que escrevi, em folhas brancas que odeio, mas que as amarei pois estarão amareladas e com histórias que não se sabe.
Agora no fim já ouço um jazz (Madeleine Peyroux), e quero tudo que nunca tive, tudo que já tive e quero de novo, tudo que nunca pensei em ter mas me foi proporcionado.
Quero continuar odiando papéis,sem culpa alguma, odiando papéis brancos e novos, apenas por saber que eles um dia serão amarelados e cheios da minha história de dia frio, numa esteira de palha (ou na rede), ouvindo um Jazz, ou um Blues, nos braços que me fazem solfejar, abraçada ao corpo quente daquele que quero por muito tempo.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

De água e sol.

Aqueles dias em que se precisa deitar na grama, sentir o sol queimar a pele, e a água refrescar as queimaduras feitas ao sol; e nem mesmo a pele sentia a queimadura feita pelo sol, pois tudo era mais água, mais puro, mais do que ela precisava.
Saiu com crianças que a pouco encontrara, e brincou, e dançou, e andou, andou, como nunca mais andara, e foi bom. E via que naqueles que nem conhecia havia algo de tão familiar que a fez perceber que tudo era de antes, de séculos antes, de vidas passadas, e que tudo já estava escrito.
Cada dia que acordava entrava em um sonho que a fazia desejar não dormir, para nele permanecer. Mas também desejava dormir, para ter os braços daquele que não entendia ser ou não seu; mas queria ver o riso, a bondade e a infinita maravilha do irmão que sua mãe não gerou.
Dormia e acordava em meio a sonho e realidade. Se sentiu criança ouvindo o barulho da água, sentindo o cheiro de mato, caminhando mais do que suas pernas conseguiam, aproveitando do que era colhido, desfrutando do que lhe era dado, e adorando os cuidados dessas duas crianças que lhe acolheram.
Um índio, um alemão (português), uma só vida, digno de uma nova carta de Pero Vaz de Caminha, ou maior que qualquer história poderia registrar. As duas crianças se aninharam em seu coração e lá permanecerão, pois tudo que viveu é pouco para o que sentiu, para o que viu, para o que ouviu, e para o que ela merecia.
Chega ao fim de uma "narração" tão pouco convencional, e as palavras já não fazem tanto sentido como antes, talvez porque o que passou não fez sentido apenas existiu num tempo em que era bom ser criança, e que não volta, mesmo que tenha se passado não mais que um dia...

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Quase um "Meu Querido Diário".

Como se fosse água fria escorre a vontade de sumir. Paro e penso no que pode ser de algo que há muito tenta ir, mas nunca consegue se deixar livre. Penso em todas as vezes que briguei, que gritei, que quis prender o que não se prende.
Ontem presenciei uma discussão, uma discussão de adolescente; e chamo de discussão de adolescente talvez por não me achar mais tão adolescente, apesar de não querer acreditar nisso. Mas, enfim, ouvi toda a discussão desde o início. Comecei a rir meio de canto de boca, aqueles sorrisinhos irônicos e de desdém. Sorri não ironizando o que discutia, ou com quem se discutia, mas o motivo pelo qual se discutia. Um motivo fútil (hoje o acho fútil), um motivo pelo qual eu tanto discuti, e isso faz algum tempo, uns três meses mais ou menos; e eu só queria a atenção daquele que não me via, só queria a atenção daquele que eu não via. 
Parei e comecei a analisar. Não analisar o que discutia, ou com quem se discutia, mas o que se discutia. E percebi que eu era assim, que sempre fui assim, que sempre serei assim, adolescente discutindo "a que horas hãn?!" "porque agora, hãn?!" " não ligou porque?!", todas aquelas perguntas que não queremos respostas, mas fazemos questão de perguntar.
Presenciando, analisando cheguei à conclusão que as perguntas só mudam o contexto, mas a adolescência da nossa insegurança, da nossa necessidade de alguém é eterna. E me veio o sorrisinho irônico mais uma vez, aquele sorrisinho de canto de boca, por lembrar que eu não estava sorrindo, presenciando ou analisando o que discutia ou com quem discutia, mas por lembrar sobre o que se discutia!

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Pedaços que não me faltam.

Tudo o que era de ser foi. Tudo em que ela acreditava se prova a cada momento. Mas quem é ela que não se mostra. Que em fotos se mostra pela metade, rosto, olhar nunca fixo. Seria o medo de se mostrar, de ser descoberta? Ela quer ser uma incógnita, uma interrogação e muitas vírgulas.
Sempre que lhe olham nos olhos se perdem, em imensidão que não cabe em lugar nenhum, mas que dá aconchego que ela não sabe de onde. Os olhos sim, esses são aqueles delatores que entregam qualquer vilão. E ela não se mostra inteira em seus olhos para que não roubem sua essência, estes delatores a incriminariam de amar, de viver, de querer mais.
Ela relembra dos tempos de colégio, dos amigos que se foram mas permanecem ainda, pois a distância é pouco. Ela lembra daquele feito de sol que só enxergava as nuvens escuras, que fez amor em seus olhos e que hoje se apresentou depois de tanto tempo achando que perdeu o verniz de ser sol, mas como pode se ele nunca se descobriu sol?
Ela relembra do que a tomou por inteiro, desde o primeiro olhar, que se vestiu dela em todos os sentidos, que nunca a abandonou mesmo nos momentos em que ela o acusou, que se vingou, que hoje ri de tudo que viveu, que hoje ainda vive com ela e que jamais a deixará, porque ambos são mais que carne e osso, são energias vindas de antepassados, orixás, elementais.
Ela pensa naquele que a fazia mergulhar em seu lago azul, e queria beijar a verde mata que havia em seus olhos, e o fazia toda manhã, e a acalmava apenas por existir. E que ainda lhe deve uma canção, ainda lhe deve muitas canções, que não tardará serão pagas. Aquele que ela não entende porque nunca tentou que fosse seu, pois sempre teve a certeza de ser seu.
Ela lembra da menina fútil que andava pela escola pisando em ovos com o coração partido. Um dia encorajou-se e a aninhou em seu colo e cantou águas, chuva, tudo para limpar as tristezas dessa menina, e a secou ao Sol, e hoje elas são uma só, muito diferentes, são as metades que se encontraram e se afastaram e que voltarão a  se encontrar.
Pensa naquela que é feita de arco-íris, já se magoou, já se desculpou, mas nunca a deixou triste. A menina que já deu frutos, que já tem outra metade, e que merece mais do que possui, pois já foi dito, ela é feita de arco-íris.
Lembra daquela que tanto a fazia rir, que não era daqui mas estava em todo lugar, que era grande demais pra tudo que a propuseram fazer, mas mesmo assim nunca deixou de enfrentar o que lhe impuseram. Que tem cor das árvores das savanas à noite, que tem sorriso de água benta e de pecado.
Pensa na branca de neve de sardas, fora e dentro dos padrões, que cantava pra não encantar, mas encantava com melodias infantis e que ainda hoje, mesmo depois de tanto tempo, depois de tantos desencontros ainda permanece nela.
Lembra daquele que tanto a enamorou e tanto faz parte dela e que tudo o que queria era que desse certo, mas não deu, ou deu certo, pois ele nunca se afastou, nunca deixou de amá-la, nunca deixou de compartilhar a sua vida com ela, nunca escreveu um livro porque disse que seriam vários e todos os capítulos sobre ela, nunca se descobriu, nunca a ouviu, apenas sabe que ela sem ele não é ser e ele sem ela...  (ele prefere como sempre não responder) 
E ela vê que a vida é boa, que ela se inspira porque existiu um tempo bom, esses "bons" permanecem nela, e ela realiza o que sempre quis, sua vida de interrogações, de muitas vírgulas, de algumas exclamações, de muitos parágrafos e nunca um ponto final. Pois eles existem.

(Aos meus pedaços: Thiago Santiago, Rafael Gabriel, Rodrigo Teixeira, Talitta Vignoto, Samara Braga, Elizane Oliveira, Rebeca "de Alvy" e Marlucio Nascimento)




Pronome.

Ela se entrega em corpo, em mente, mas porque lhe fogem as palavras. Essas que se ramificam em sua língua como serpentes, e que ferem como garras. Essas que latejam como ferimento em pus, e que doem feito faca cega em bucho de gente.
Ela se entorpece de amores, de paixões, de sexo, de luxúria. Mas se enclausura em metáforas, eufemismos.
Ela é onomatopeica, geme, goza, faz, acontece, mas o enclausuramento permanece entre quatro paredes. Ela quer ser a luz da janela dessa noite, quer ser o cheiro da construção, quer ser a água do chuveiro que demora a esquentar, quer ser a toalha que não está lá, quer ser a tatuagem que não consegue ver, quer ser o sorriso que não consegue decifrar.
Ela não transa, faz amor. Ela não berra, fala alto. Ela não enlouquece, perde a cabeça. Ela não xinga, fala com firmeza. Ela é a terceira pessoa do singular, nunca a primeira. Ela não quer ser a par, ela quer ser a ímpar. Ela não é ela, ela sou eu!

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

5 minutos.

Acordou de um sonho bom. Acordou com as dores da realidade. Com o cheiro que tinha deixado na pele. O cheiro não era mais de sonho, era de tudo que alguém que vive pode sofrer. Tudo de alguém que vive e pode ser feliz. Tudo de alguém que vive!
A boca seca, os olhos pesados, os músculos doloridos. A mente leve, o coração leve, as pernas leves, e quem diria...o corpo leve! É uma daquelas manhãs tarde em que tudo parece bem, e ela sempre espera o que é bom, esperando o que também pode vir de ruim. Ainda nem se levantou e a mente já fervilhava de palavras e acontecimentos que se confundiam com tudo que prometera não mais acontecer; mas como resistir, pois vive no mundo em que nada deve ser desperdiçado, principalmente os gostares, os cheiros, os paladares, os tatos, as visões, os ruídos... Todos os seis sentidos são aguçados; sim, os seis sentidos, pois os efêmeros momentos são eternizados naquelas partículas que voam soltas no ar quando bate o sol pela fresta da janela. E possui tanto querer que dá medo, tanto amor que dá medo, tanto carinho que dá medo, e tanto medo que dá medo.
Quer pular de um precipício, mas decide pular no precipício, agarrar-se aquilo que não se sente, que não se entende e se sente viva, adolescente, irresponsavelmente responsável, e se entende pela primeira vez, e compreende que era essa metade amputada há tanto que lhe faltava de uma maneira ou outra.
E até se pega com achar de posses que não existem, com pensamentos "infantis", com cara amarrada, engolindo o sorriso de outrora. E espreguiça, e se levanta, e já está tão cheia...!! E se preocupa, não com o tempo, mas com as inúmeras coisas que se passaram em tão pouco tempo essa manhã, se encheu até a borda desses primeiros cinco minutos de sua manhã. E se alegra novamente, ninguém mais no mundo desfrutou desses minutos, eles são só seus.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Perder-se em redundância.

Ela tenta e tenta, mas não consegue.
Ela anda e anda e anda, mas não sai do lugar.
Ela pensa e pensa e pensa, mas não chega a uma conclusão.
Ela sorri, sorri, sorri, mas não consegue se convencer da sua felicidade.
Ela chora, chora, chora, mas não consegue entender o porquê.
Ela dança, dança, dança, mas não sabe para onde estão indo seus pés.
Ela respira, inspira, expira, mas não sente se seus pulmões se encheram.
Ela roda, roda, roda, mas não consegue ficar tonta.
Ela olha, olha, olha, mas não enxerga.
Isso porque o tentar independe dela.
Isso porque milhas percorridas são pequenas para seus sonhos.
Isso porque as conclusões aparecem quando não se pensa.
Isso porque a felicidade está dentro e não fora.
Isso porque as lágrimas só molham a face de quem é seca, e não de quem é banhada de tanto "bom".
Isso porque os pés seguem a música e o coração a terra.
Isso porque o amor é anaeróbio.
Isso porque as tontices já fez.
Isso porque não se vê o interior tão facilmente.
Enfim, há que se deixar de ser autosuficiente.
Enfim, há que se caminhar mais e sonhar muito mais.
Enfim, há de se preencher de nada por mais tempo.
Enfim, há de sorrir mais por dentro.
Enfim, há de se naufragar no que já se sabe e no que ainda está por vir.
Enfim, há de se cantar mais e dançar mais.
Enfim, há de se entregar mais.
Enfim, há de enlouquecer-se mais.
Enfim, há de se encontrar e se perder mais!