Chegou o inverno, chegou a falta de cobertores, chegou a falta de calor.
Olho os meninos nas ruas sendo tirados pela polícia porque invadiram uma varanda, varanda para se aquecer. Me pego devendo visitas e amores que não correspondo, mas que me cobram como amizade só para me ter.
Me pego cobrando uma dívida amorosa que eu não tenho porque cobrar, simplesmente porque te odeio, odeio esse 'você' que eu criei e amei.
Me pego correndo do passado porque ele corre atrás de mim a pés ligeiros, e me pego arrancando pedaços de mim e deixando no caminho para que a corrida se torne mais branda, com menos peso, mas vou deixando as migalhas no caminho.
Bethânia me fala que é até bom o domingo pois "domingo eu não choro domingo eu não sofro", mas estou apertadinha dentro de mim, me aquecendo desse inverno que se instalou e talvez me restaure.
São os amores de longe que me apertam o colo, os amores ainda não consumados na carne, são esses amores que eu levo até o fim, pois estão em mim e ao meu lado quando eu busco algo de bom aqui.
Em conversas de bar, em lamúrias de botequim, é muito engraçado ouvir um samba e parecer até que ele foi feito pra mim. Sentada sozinha em uma mesa de bar, com petisco ao lado e cerveja gelada, num dia gelado, com a mente fria querendo pensar... pensar em nada. Olhando o branco de fora e me pego passando as mãos nos cabelos como se tivesse acabado de acordar. Levantei e me pus a andar, nem paguei a conta, era meu tudo que consumi. E o samba continuava, e eu continuava, e o frio continuava, então porque me apegar a coisas que não continuam, a coisas impalpáveis, a coisas sinuosas que me fazem derrapar no caminho já traçado pra mim?
É bobeira, assim como escolher escrever crônicas quando nem sei como começá-las, e elas terminam como um 'meu querido diário'. É bobeira, escolher você se você não me escolheu, se só encolheu o que havia de grandioso e nos arrasta pela perna, o corpo mole, a boca cheirando a aguardente e a frigidez.
É bobeira continuar enquanto você não me enxergar. Enquanto eu for somente a puta paga, a escrava doada, o chinelo encostado e furado no meio. Enquanto eu não for, enquanto eu não me deixar ir, é bobeira.
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